Existem muitos documentários sobre músicos e bandas em que o passado é revisto e explicado para as gerações posteriores, porem, há diretores que vem documentando a atualidade também. Talvez isto funcione bem para nós não apenas termos um retrato do que esta rolando, mas tentarmos entender os caminhos que o mundo da música e suas cenas podem tomar daqui para frente. Nesse aspecto o que chama a atenção são dois documentários atuais que tratam do mesmo estilo musical (música eletrônica), mas o conceito de cada um mostra pessoas e idéias um pouco diferentes. Apesar das diferenças, ambos no final têm o intuito de causar um estrago nas pistas de dança.
Numa das vertentes do eletrônico conhecido como Maximal, o diretor Stephen Vasquez mostra um pouco dessa cena no documentário The Electro Wars. Com participações de Justice, Chromeo, Dj Premier (que tocava com o finado Guru, que morreu alguns dias atras), A-Trak (considerado um dos dj's mais técnicos do mundo) e Diplo, o documentário disseca o que vem acontecendo nos últimos 3 anos, em que o hip-hop, o rock e o eletrônico se fundiram e geraram milhões de blogs com remixes e a necessidade diária de novidades dentro do estilo (o mais famoso sendo o Hype Machine). Com seus sintetizadores sujos e saturados, batidas que unem o peso do rock e o balanço do hip hop, o Maximal tomou de assalto o mundo com a chegada de Cross – o primeiro álbum da dupla Justice. O que me parece na verdade é que rockeiros descobriram o Discovery, do Daft Punk, (eu incluso) e resolveram copiar de maneira indiscriminada a equalização French Touch. Tal qual foi criada e solidificada pelo grupo nesse disco. E sinceramente, talvez o maximal tenha sido o estilo musical que mais converteu pessoas para ouvir e dançar um eletrônico nas pistas de dança.
Por causa dos maximal, muitos desses "convertidos" trocaram suas guitarras por MacBooks e resolveram também adotar um visual hipster, num processo de desconstruir os conceitos originais de música eletrônica. Se antes as músicas no eletrônico eram longas, instrumentais e minimalistas, e quase levavam a pessoa num transe, o que impera hoje são músicas curtas e entrecortadas por versos e refrões cheios de vozes, com muita influência de disco music (que inclusive chegou a gerar um estilo paralelo entitulado Nu Disco), batidas pesadíssimas e tentativas de misturar tudo o que for possível em poucos minutos, ou seja, juntar funk carioca com Nirvana é muito bem visto por essa galera. Outro aspecto interessante do maximal foi levantado pelo músico Juan Maclean, artista que faz parte do selo nova iorquino DFA. Maclean acusa que o maximal é apenas uma desculpa para que esses rockeiros toquem house music sem serem taxados de homossexuais, e que a sonoridade pesada do estilo é "macho" demais.
Com a falta de critério que esse estilo as vezes tem, e o deslumbramento de tanto poder sonoro facilmente automatizado num laptop, o que sera que aconteceu com o pessoal de eletrônico mais tradicional? Eles vão bem obrigado, e tambem tem seu documentário traçando suas carreiras atualmente. No filme Speaking In Code, a diretora Amy Grill acompanha vários djs de techno e minimal techno ao redor do mundo, junto com seu marido viciado no estilo. Com participações de Michael Mayer e Wolfgang Voight (donos do selo de minimal mais famoso do mundo, a Kompakt), Ellen Allien, Modeselektor e Monolake (famoso por ser um dos criadores do software de música eletrônica Ableton Live, usado especialmente pelo pessoal do maximal), o filme documenta a trajetória dos músicos de minimal, e mostra tambem as tentativas de promoters e jornalistas em transformar os EUA num lugar que aceite mais o techno tradicional (lugar atualmente assolado pelo maximal), e como isso faz o relacionamento da diretora com seu marido quase terminar. Engraçado que uma das maiores cenas mundias de techno originou-se em Detroit, mas o estilo ganhou muito o fanatismo dos europeus com o tempo.
Não só os dois estilos são bastante diferentes entre si, mas tem agregado fãs de outras áreas para seus movimentos. No caso um exemplo notório é Iggor Cavalera, ex-baterista do Sepultura e que tem um projeto de eletrônico maximal com sua esposa chamado Mix Hell. E se o minimal precisar de uma baterista fodão com um belo histórico no metal e no rock alternativo, eis que John Stanier esta ai pra representar a outra vertente. É difícil eu falar de Stanier, ele basicamente é um dos meus bateristas prediletos, e além de ter arregaçado bastante nos melhores discos do Helmet, ele toca atualmente no math rock eletrônico do Battles. Sua participação no minimal é muito importante, pois alem de levantar a bandeira do estilo em entrevistas, ele tocou bateria no disco Yesterday And Today, do The Field. O álbum conseguiu ter o maior número de vendagens na história da Kompakt, e provavelmente dentro do minimal techno.
Existe uma birra deste que vos escreve em relação ao maximal, e confesso que frequentei fervorosamente muitas festas desse estilo em parte de 2008 e 2009. Acho que o estilo é uma cria natural dessa década revolucionada pela internet e o mp3, onde muitas pessoas foram expostas a músicas diferentes e fora do eixo do mainstream, de maneira rápida e mais efetiva do que qualquer gravadora grande com esquemas milionários de divulgação jamais atingiu. Não nego que o primeiro disco do Justice caiu como um monolito de outra dimensão na minha vida, porem o descontentamento pela cena veio rápido. Vendo tantos dj’s de maximal com som parecido apenas lançando remixes, fazendo mixtapes de remixes e remixando remixes, fica a vontade de ver um trabalho mais autoral e sem medo de ser artístico e ousado. As vezes eu simplesmente não entendo o propósito disso, pois a maioria desse pessoal não faz nenhum live act (ou seja, um show ao vivo) com sintetizadores e baterias eletrônicas, e só ficam nessas de discotecar os próprios remixes confortavelmente em seus laptops . O próprio Justice disse em uma entrevista que as pessoas gostam de destruir aquilo o que elas constroem para si, e talvez vejo me caindo na premonição deles.
Basicamente foi tudo muito bom enquanto durou, mas opiniões e gostos mudam, e quem sabe até das próprias pessoas que participam da cena. Engraçado é ver Pedro Winter (a.k.a. Busy P), dono da Ed Banger Records (o selo de maximal mais famoso do mundo), comentando numa entrevista recente com o Mix Hell que tem curtido muito dubstep. O mais curioso da declaração é ver um dj dos mais festeiros mundialmente gostando de um estilo de música em que a maioria dos seus artistas são reclusos, misteriosos e preferem sonoridades mais abstratas. Talves isso não va mudar o foco sonoro da Ed Banger, mas me da a deixa de falar mais a respeito do dubstep tambem...quem sabe num próximo post!
Ainda não sabemos muito o que vai dominar em 2010, mas com a ascenção do dubstep e o surgimento do chillwave, vamos ter muito ainda do que falar sobre música eletrônica.
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